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Merecida homenagem

23/08/2014

Dia 11/08 a câmara de vereadores de nossa querida Pinhal homenageou pessoas fantásticas que contribuem para a cultura pinhalense, e meu pai foi um dos homenageados, e não podia deixar de usar meu espaço no Pinhal News para que todos possam se deliciar com uma das crônicas que mais gosto, principalmente porque foi escrita em um mês de agosto da década de 90.

Com vocês, de Antônio de Pádua Barros:

A LIÇÃO DO IPÊ

De manhã, quando abro a janela da sala, a primeira coisa que vejo, depois das minhas azaléas, é o ipê no jardim da casa vizinha de frente, do outro lado da rua.

Não sei qual é a sua idade mas tenho, guardada na memória, uma visão magnífica desse ipê na sua florada de 1991, segunda quinzena de agosto. Chamava a atenção de todas as pessoas que por aqui passavam, tal foi a exuberância de sua florada, aquele amarelo vivo destacando-se sobre o céu azul.

Sempre admirei o ipê por sua maneira peculiar de florir: desfaz-se de todas as suas folhas e, de repente, em poucos dias, veste-se daquelas lindas flores amarelas com generosa abundância.

No ano passado, esse ipê, meu vizinho de frente, sofreu um grande revés. Por questões técnicas de segurança, o poder público cortou vários galhos de sua copa, que ameaçavam os fios da rede elétrica. Um outro galho, mais baixo, mas que se debruçava sobre a rua, também foi cortado por motivo de segurança no tráfego de veículos. Some-se a isso a prolongada seca que atravessávamos e o nosso ipê, além de desfigurado pelas mutilações, parecia doente, triste e sem forças.

Contudo, chegou o final de agosto e ele desfez-se das suas folhas. Dias depois, amanheceu com algumas flores. E ficou assim por mais uns dois dias.

-Neste ano, o ipê não vai florir – pensei comigo.

Todavia, na manhã seguinte, quando abri a janela da sala, surpreendi-me ao ver o velho ipê fartamente vestido de flores em todos os galhos que restaram. Não estava tão bonito como nos anos anteriores, sem grande parte de sua frondosa copa, mas fez o máximo que poderia fazer.

Saí de casa, atravessei a rua e fui admira-lo de perto. Dizem que as pessoas, na terceira idade, têm mania de falar sozinhas ou conversar com animais e plantas. Talvez isso seja efeito de tantas decepções com os seres humanos... Pois nesse dia eu dirigi a palavra ao ipê.

-Parabéns, meu amigo. Pensei que, neste ano, você não daria flores. E, se assim agisse, estaria coberto de razão, depois do que lhe fizeram... Contudo, aos rudes golpes do machado técnico você retribuiu com flores! Parabéns.

-Não sei porque está admirado, vizinho – alguém me disse, numa voz suave e firme.

Olhei para os lados, procurando quem falara. Mas não havia ninguém.

-Sou eu, vizinho, o ipê bem aqui na sua frente. Repito que não sei porque você está admirado. Afinal, estou apenas cumprindo o mandamento do Cristo, que você tanto prega. Não temos que retribuir ao mal com o bem? Não interessa se me cortaram os galhos ou se a seca me castiga. Cabe a mim dar sombra durante o ano e, nesta época, enfeitar a rua com minhas flores. Para isso nasci e cresci. E enquanto eu tiver, mesmo que seja apenas um galho, minha missão é dar sombra e flores. E assim farei, sempre.

Depois de alguns momentos de silêncio, continuei ouvindo aquela voz firme e suave.

-Não entendo vocês, humanos. Ao invés de colocarem os seus talentos – pois todos os têm – a serviço dos outros, da comunidade, vivem numa guerra constante: invejas, ódios, vinganças, fofocas, corrupção, exploração dos mais fracos... Quanto à Natureza, nem é bom falar. Maltratam os animais, cortam as árvores, poluem os rios, enchem os ares de fumaça. Depois, vão aos templos louvar a Deus e à mídia falar de direitos humanos e ecologia! Não entendo vocês humanos...

Um carro que passou abafou com o ronco do motor aquela voz suave e firme. Depois, não ouvi mais nada. Atravessei a rua de volta à minha casa e fiquei, por mais uns minutos, olhando o ipê, agradecido pela lição que me dera.  

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